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Sara Raposo Tobias tentou menosprezar os sinais da doença mas não escapou ao diagnóstico de Crohn

“Tive de aprender a escutar o meu corpo”

 |  Alexandra Ferreira  |  ,

Sara Raposo Tobias, portadora de doença crónica de Crohn, descobriu-a depois de muitos exames e testes médicos. Vive agora um dia de cada vez desde que soube que o diagnóstico era o de uma doença “para sempre”.

No âmbito da Semana da sensibilização das Doenças Inflamatórias Intestinais convidamos alguns doentes com esta enfermidade para nos darem o seu testemunho de como a doença lhes mudou a vida. Hoje é a vez de Sara Raposo Tobias que nunca imaginou poder ter uma doença crónica tão invisível para os outros.

A doença de Crohn surgiu numa das melhores fases da minha vida – 2015/2016. Já tinha alguns sintomas (dores) mas camuflava
com medicação porque a vida não podia parar.

Em 2016 fiz a minha primeira grande viagem ao Sudeste Asiático e, quando regressei, os sintomas tornaram-se mais graves, ao nível de eu não aguentar mais com dores e ter de ir às urgências.

A partir daí foi uma bola de neve: exames e mais exames (inicialmente pensou-se que fosse uma bactéria da Ásia). Nesse mesmo ano fiz 5 colonoscopias e só à quinta vez é que me foi diagnosticada a doença, sendo que pelo meio fui internada no hospital.

Levei-me ao limite porque queria ignorar os sinais da doença e ter o mesmo ritmo de vida: saía de casa às 8h da manhã, trabalhava a full-time e depois tinha aulas quase todos os dias do mestrado que estava a frequentar na altura (chegava a casa por volta da 00h).

Fui acompanhada por 3 gastroenterologistas diferentes e comecei a compreender que não sabia nada de nada de saúde, era uma simples laica com uma doença que até então desconhecia. Pesquisei bastante, pedi segundas-opiniões, meti-me em grupos de Facebook da doença.

Este último ponto tenho que fazer uma ressalva: ajudou-me imenso e foi através deles que hoje tenho o meu grupo das amigas do Crohn. Ou seja, tive de me mexer, porque os médicos queriam que eu começasse a tomar um tipo de medicação que, para mim, seria um não voltar atrás e “para todo o sempre”.

Esta última citação sempre me incomodou bastante e ter um diagnóstico que é para a vida, é difícil de lidar inicialmente.

Na altura, comecei a ser seguida (que já tinha tido acompanhamento com sintomas que agora compreendemos que já estavam ligados ao Crohn) por Medicina Integrativa, pelo Dr. Juan Carlos Herrera.

No meu entender, devemos de ter um equilíbrio para tudo na vida e esta vertente dava-me tranquilidade de estabilidade/ remissão/cura para uma “sentença para a vida”.

Durante quase 1 ano, fiz imuno supressores e só piorava, doía-me as articulações, tonturas constantes, não conseguia comer, caía-me o cabelo, etc. Mas o que mais me preocupava era a confusão mental: esquecer- me e fazer confusão com tudo, senti que estava a perder capacidades mentais e isso assustava-me imenso. A ansiedade começou a fazer parte da minha vida e comecei a compreender também a enorme importância da saúde mental, por isso desde essa altura até agora (sempre que necessário) sou acompanhada por a psicóloga Dra Verónica.

Cheguei a um ponto que tinha duas opções: fazia medicação biológica (que os médicos diziam-me que depois de começar muito dificilmente deixava de a fazer) que tem imensos efeitos secundários mas que, supostamente, me iria trazer a tão esperada remissão ou escolhia um caminho mais longo, através da medicina integrativa, que seria mais demorada mas, a longo prazo, iria dar os resultados que eu pretendia.

Dado à experiência anterior, seguir para outro patamar de medicação que ainda é mais agressiva, quando felizmente tenho outras opções, era óbvio para mim!

Decidi escolher a segunda e não foi aceite de ânimo leve pelos meus médicos. E preciso de falar sobre isto: os/as pacientes sentem-se impotentes quando não têm conhecimento sobre a doença e o seu corpo, confiam nos médicos/as e no que indicam, sendo que estes fazem o que podem e o que está nas suas mãos mas no final, a decisão e responsabilidade está sempre no/a paciente e não no/a médico/a!

Sou eu, enquanto portadora da doença, que devo de escolher o que acho que possa ser o melhor para mim, mesmo que isto signifique ir contra o que um especialista me diz para fazer ou não. E eu sempre quis conciliar as várias vertentes da medicina, ninguém é detentor da verdade e da cura absoluta, a medicina convencional continua a não dar resposta a imensas doenças/casos e é um trabalho diário de investigação.

No meu entendimento, conseguir unir ambos os conhecimentos para depois decidir o que é melhor para mim, foi e tem sido a minha melhor opção.

Claramente é um caminho que se faz caminhando, já aceitei a doença e que vai-me acompanhar para a vida, não como inimigo mas como “companheiro?” que me traz lições diariamente.

Tive de aprender a viver outra vez: a escutar o meu corpo e necessidades, a cuidar da minha saúde mental, de abrandar o ritmo quando necessário, a olhar a vida de outra perspetiva. Literalmente a aprender a viver o presente porque não sei o dia de amanhã.

O Crohn fez-me crescer internamente e a ter uma maturidade que provavelmente não teria se não tivesse estas circunstâncias na minha saúde. Se hoje me sinto mais humana e com mais auto-conhecimento, também é devido ao crohn.

SARA RAPOSO TOBIAS, doente de Crohn

 

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