fbpx
Alisia vive em Kherson, ocupada pelos russos, onde a população continua a resistir

“Soldados russos raptaram o meu irmão da nossa casa”

 |  Alexandra Ferreira  |  ,

Os ucranianos que vivem em zonas ocupadas pela Federação Russa estão a passar por um verdadeiro pesadelo. Alisa é de Kherson.

O primo Andrii Gorshkov, a quem ela considera um irmão, foi sequestrado da própria casa onde residiam e está desaparecido…

Agora está refém dos russos e Alisia não sabe dele.

Alisia já fez de tudo para encontrá-lo mas não consegue. Ela fala-nos das torturas, das deportações e das ameaças constantes que pairam sobre todos os ucranianos que ainda estão naquela cidade ocupada pela Federação Russa.

“O meu primo foi sequestrado por soldados russos da nossa casa em Kherson há dois meses, no dia 30 de março. O meu primo era membro da defesa territorial, como civil e ex-polícia. Chamo-o de irmão porque somos muito próximos”, conta esta mulher.

“No início da invasão em grande escala, Andrii voluntariou-se logo para a defesa territorial. A partir do dia 1 de março, quando o Kherson foi completamente ocupada pelas tropas russas, o meu irmão continuou a resistir e de todas as formas possíveis ajudou as nossas tropas internas a destruir o invasor e agressor”, diz Alisia.

De acordo com ela, “Andrii demitiu-se da polícia há um ano. Por isso, nunca imaginámos que soldados russos nos pudessem bater à porta. Tanto mais que quando surgiu a ameaça de ocupação, a lista de defesa territorial foi destruída para evitar perseguições.”

Mas nem tudo correu como eles imaginaram: “No dia 30 de março, por volta das 10 da manhã, membros dos serviços especiais russos vieram à nossa casa, desmancharam o interior do apartamento à procura de alguma coisa. Apreenderam os nossos pertences pessoais, equipamentos e outros bens”, relata.

“Andrii tentou fugir, mas apanharam-no depois de ter saltado pela janela. Os nossos vizinhos contaram-me que foram cerca de 15 militares russos armados atrás do meu irmão. Amarraram-no e empurraram-no para dentro do carro”, diz.

Alisia revela que esperou quatro dias para que libertassem o irmão. “Tal não aconteceu. E, a 3 de março, escrevi ao comandante russo a falar sobre o rapto do meu irmão. Foi difícil para mim ter de entrar em contacto com soldados russos” para tentar saber o que se passava com Andrii.

“Ao início tentaram oferecer-me trabalho na polícia de ocupação, depois ofereceram-se para me ajudar a ser evacuada para a Rússia. Mas depois das minhas inúmeras recusas, um dos soldados russos começou ameaçar-me…

Ele disse, e cito: “Vamos deportá-la de qualquer maneira, quer goste ou não”.

Mais tarde naquele dia, “recebemos uma mensagem de áudio do telefone de Andrii a dizer que ele estava bem para não ficarmos preocupados. No gabinete do comandante prometeram ligar-me com uma resposta sobre o paradeiro do meu irmão. Nunca aconteceu.”

Durante esses dois meses a família recebeu um total de quatro mensagens de áudio de Andrii e acabou por se convencer que ele estava escondido na casa de algum amigo.

No dia 5 de maio, chegou uma mensagem enviada do telemóvel dele “a dizer que Andrii foi preso pelas tropas russas por participar da defesa territorial.”

No dia 10 de maio estava em Sebastopol, na Crimeia, “num centro de detenção pré-julgamento por um crime contra as tropas russas.”

Três dias antes, a 7 de maio, “o meu irmão apareceu em canais de notícias de propaganda russa iz.ruren.tv onde foi publicado um vídeo com Andrii agarrado ao braço direito e muito deprimido.”

“Não sabemos exatamente a localização e condição física de Andrii até ao momento. Soube através de um advogado, que nenhum processo criminal ou administrativo foi aberto contra Andrii no território da Federação Russa.”, esclareceu.

Alisia enviou uma solicitação ao centro de detenção pré-julgamento Simferopol SIZO-1 em Simferopol e obteve uma resposta de que Andrii “não foi detido e não está detido”.

“Para os soldados russos, não importa se somos civis, militares, voluntários ou simples ativista, seja mulher ou homem. Todos os cidadãos de Kherson ocupada e da região estão em perigo”, explicou.

Torturas e ameaças

De acordo com Alisia, “os ocupantes são muito cruéis e gostam de torturar”, diz, revelando os tipos de tortura mais usada pelos soldados russos naquela cidade ocupada.

“Espancamentos. Por vezes os militares tentam esconder as marcas que deixam nas pessoas, mas houve casos em que era impossível esconder as feridas na cabeça e olhos”, conta.

“Também gostam de dar tiros junto à cabeça das pessoas ou golpes constantes de pistola com ameaças. Este é um método muito usado pelos invasores mesmo quando fazem detenções nas ruas”, diz Alisia.

A mais sádica é de facto a da “corrente elétrica”. Diz ela que na Rússia,  “é um método muito popular ao qual deram o nome de ‘chamada para Putin’. Eles prendem fios elétricos às orelhas, às vezes aos genitais e passam uma voltagem elétrica de várias intensidades pelo corpo dos detidos”, revela.

E como a vida é mais dura numa cidade ocupada, Alisia e os seus conterrâneos vivem sobre constantes ameaças de represálias contra os familiares.

“Os ocupantes verificam todos os números da lista telefónica e as mensagens dos telemóveis. Depois forçam-nos a escrever e a conduzir diálogos com pessoas através das mensagens privadas e da nossa lista de contatos para observarem as reações à conversa. Foi o que fizeram com meu irmão.”

Outro dos métodos usados pelos ocupantes “é sufocarem as pessoas detidas. Eles bloqueiam o acesso ao oxigénio fazendo isso sistematicamente por longo tempo. Dessa forma conseguem fazer as pessoas falarem e cooperarem com eles”, conclui.

Kherson continua a resistir aos ocupantes

As autoridades de ocupação russas em Kherson Oblast temem a resistência dos moradores locais e trouxeram quatro canhões de artilharia pesada autopropulsados ​​do tipo Pion para a cidade.

O movimento de guerrilha de Kherson continua a alertar as tropas de ocupação russas que elas não estão seguras na cidade ucraniana ocupada, colocam panfletos por todo o lado e ainda os distribuem pela população.

De acordo com o Comando Operacional Pivden [Sul] no Facebook, “os ocupantes estão com medo da resistência que está a crescer entre a população local em Kherson Oblast.”

Todos os dias, novas bandeiras, declarações motivacionais e missivas aos ocupantes aparecem no centro administrativo da cidade de Kherson e distribuem panfletos pela população.

Os líderes do governo de ocupação estão a movimentar-se com um grande número de seguranças, sempre com coletes à prova de balas e em veículos blindados. Temem pelas vidas.

Portanto, quatro canhões de artilharia pesada autopropulsados ​​do tipo Pion foram trazidos para a área de Kherson.”

A ligação de telefone e internet fornecida pelos provedores de serviços móveis ucranianos foi restaurada em algumas das comunidades territoriais em Kherson Oblast.

O serviço móvel está disponível nas partes libertadas – e agora controladas pela Ucrânia – de Kherson Oblast: nas hromadas de Kochubeivka e Novovorontsovka.

Relacionados


© 2022 Direitos reservados. É expressamente proibida a reprodução na totalidade ou em parte, em qualquer tipo de suporte, sem prévia permissão por escrito da Segue News. | Prod. Pardais ao Ninho.