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Monteiro Cardita
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Quarenta e um

São cada vez maiores os dias. O equinócio de Primavera anuncia-se para breve. No florir das plantas, no chilreio dos pássaros e até nas vozes das pessoas que mudam do tom cinzento, agreste, para um outro suave, azulado e alaranjado do sol ao entardecer.

E na vontade de desibernar também. Apesar de lá fora na rua o frio persistir em ficar e não se quer mesmo ir embora.

Este ano um pouco por todo o lado tarda em ir embora, a deixar-nos, obrigando ao uso continuado de roupas e sapatos mais quentes, e aos impermeáveis não vá um inesperado chuvisco soltar-se de uma nuvem passageira.

É o ciclo da vida a repetir-se. Mal começou o ano e já se viraram dois meses, não tarda três, num tempo que parece cada vez correr a alta velocidade como os comboios mais modernos nos países desenvolvidos do planeta.

Foi precisamente num desses que outro dia me desloquei a Colónia, cidade alemã que sempre quis conhecer por causa da sua célebre catedral, mas que por uma razão ou outra fui adiando a visita.

Mais do que a exuberância do gótico, a estonteante beleza dos vitrais, a magnifica azulejaria do chão, os rubros guardiões do templo, ou as dimensões faraónicas do edifício, o que impressiona verdadeiramente pela negativa é a sujidade da pedra exterior.

Um horror devido ao elevado grau de poluição atmosférica. O valor arquitetónico da peça merecia um outro tratamento por parte das entidades responsáveis pela guarda dos monumentos históricos, particularmente os de forte dimensão artística. Tanto mais quando se está no mais rico país da Europa.

A construção deste templo começou em 1248 e levou, com as interrupções, mais de 600 anos para ser
concluído. As suas duas torres possuem 157 metros de altura cada uma, e a catedral tem um comprimento 144 metros e uma largura de 86 metros. Quando foi dada por terminada em 1880 era o edifício mais alto do mundo. Rendido à beleza da construção, não posso deixar de homenagear as sucessivas gerações de mestres arquitetos que tão magnifica catedral erigiram.

Porém, na cidade com o monumento mais visitado de toda a Alemanha, o que mais me despertou os sentidos foi a arqueologia, uma reminiscência das antiquíssimas defesas da cidade deixada pelos romanos. Continua de pé um torreão das antigas muralhas construído no ano 50 a.c., sobrevivente de inúmeras guerras e de duas mundiais.

E pus-me as imaginar a mais variada soldadesca que ao longo dos séculos defendeu aquele espaço dos invasores.

De espantar foi a rápida passagem pelo grande hall do hotel da 25.ª hora. Um espaço futurista
saído diretamente das melhores séries e filmes de ficção científica, em que cada reentrância nos reporta para diferentes cenários, desde os do Espaço 1999 passando pela Guerra das Estrelas e outros de filmes de culto.

Também de admirar foi na mais concorrida rua comercial da cidade, a rua das marcas na tradução literal, me ter deparado com um jovem sentado num solitário banco lendo muito compenetradamente o seu livro alheado do movimento dos sacos e dos embrulhos das compras que passavam.

Não é à toa que se diz que os portugueses estão por toda a parte. Estão mesmo. Nem queria acreditar que as primeiras palavras que escutei mal pus os pés em solo alemão foram em português.

Aos meus ouvidos chegaram os sons de “quarenta e um”. Foi como que uma epifania do espirito luso ali se tivesse manifestado sem sombra de dúvida e mais tarde reafirmado no Hard Rock Café local.

Primeiro, foi uma portuguesa de raízes angolanas que abriu largo sorriso e desatou a falar connosco em português com sotaque lisboeta mal percebeu a nossa nacionalidade. Depois, quase logo de seguida, instando pela colega que lhe segredou estar um grupo de portugueses no bar, abeirou-se de nós o jovem e despachado gerente do espaço para desenferrujar a materna língua de Camões e contar-nos de modo
abreviado, mas coloridamente das suas vivências em vários estabelecimentos congéneres em diferentes cidades da Europa. Entre as melhores referiu Roma e Amsterdão.

E a pior era mesmo a de Colónia, devido à frieza dos alemães, pese embora a beleza da histórica cidade.

Opiniões de um português do mundo que obviamente se respeitam em razão de tão rica e
variada experiência de vida.

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