Na Colômbia é a festa. O assunto das quatro crianças que sobreviveram 40 dias na selva colombiana está ao rubro.
O presidente colombiano declarou-as como “um exemplo de sobrevivência que ficará para a história”, mas a verdade é que as crianças, criadas numa comunidade indígena autossuficiente, cresceram a aprender como sobreviver dos recursos da floresta.
O pequeno avião caiu dia 1 de maio. As crianças – de 13 anos, 9, 4 e a mais nova de 11 meses de idade – que sobreviveram à queda ficaram sozinhas e isoladas, sem a mãe que acabara de morrer, numa zona onde vivem animais selvagens e onde existem vários perigos.
As autoridades uniram-se aos indigenas tendo tentado de tudo para as encontrar. Largaram panfletos do aar, puseram a avó dos meninos a enviar mensagens por altifalantes, tinham cães de busca – quatro dos quais acabarm por se perder, o exército uniu-se aos locais e aceitaram os conhecimentos indigenas.
Na noite do dia 9 de junho, as quatro crianças da tribo Huitoto, povo indígena na Colômbia, foram resgatadas vivas, com o presidente colombiano a declará-las as “crianças da floresta” e a dá-las como “um exemplo de sobrevivência total que ficará para a história”.
Na verdade, a infância dos meninos foi aprender a viver na selva
A educação dada pela família para de pequenino se ir aprendendo a conhecer o que a selva tem de bom e de mau, onde lhes foi dado a distinguir frutos venenosos de bons e proteger-se de animais selvagens. Esta foi sempre a infância das crianças desta tribo. Foi o que lhes valeu na prática.
Todos ficam boquiabertos com a resiliência dos menores, questionando como é que as quatro crianças, a mais velha com apenas 13 anos e com dois bebés de colo, conseguiram sobreviver?
Depois do resgate, soube-se que a sobrevivência na floresta sempre fez parte da vida das crianças, que cresceram no seio de uma comunidade indígena habituada durante séculos a viver da terra.
Citado pela BBC, o avô, Fidencio Valencia, explicou que as duas mais velhas, Lesly e Soleiny, com 13 e nove anos, estavam habituadas à fauna e flora do local, e John Moreno, um líder do grupo Guanano no sudeste da Colômbia, apontou que as crianças foram educadas pela avó, uma respeitada líder indígena.
“Elas usaram o que aprenderam na comunidade, confiaram no seu conhecimento ancestral para sobreviver”, afirmou Moreno.
Já a tia, Damarys Mucutuy, contou aos jornalistas colombianos que era comum a família brincar a jogos de sobrevivência enquanto cresciam. “Quando jogávamos, montávamos pequenos campos. Ela [Lesly] sabia que frutas não pode comer porque há muitos frutos venenosos na floresta. E sabia cuidar de um bebé”, acrescentou.
As pistas deixadas pelas crianças, e encontradas pelas autoridades, foram dando esperança pelas equipas de resgate por, precisamente, demonstraram que alguém se encontrava no local – desde pegadas, a fruta parcialmente comida, a abrigos feitos com ramos e atados com elásticos do cabelo. A certa altura, foi encontrada farinha, confirmando-se mais tarde que estas tinham recuperado farinha do avião destruído.
Estas consumiram farinha até terminar, passando então a alimentar-se de sementes. “Há uma fruta, semelhante à romã. Elas estavam à procura de sementes para comer a cerca de um quilómetro e meio do sítio do acidente”, acrescentou Edwin Paki, um dos líderes tribais que ajudou nas operações de buscas.
Ainda é incerto sobre como é que as crianças conseguiram purificar e beber água, mas as dificuldades alimentares não foram as únicas. São, aliás, apenas um dos fatores de sobreviver na Amazónia que, como se sabe, é um berço de alguns dos animais mais perigosos do mundo.
A zona onde o avião se despenhou é prolífera em cobras, jaguares e mosquitos com doenças letais, entre muitos muitos outros. O presidente colombiano, Gustavo Petro, referiu após o resgate que as crianças tiveram de afugentar um cão selvagem.
Salvamento épico
O desaparecimento das crianças motivaram uma operação de salvamento única, com voltas e contravoltas por parte do presidente colombiano, que chegou a ser muito criticado por publicar falsamente que as crianças já tinham sido encontradas.
As táticas usadas pelas autoridades incluíram a largada de 10 mil panfletos na floresta, com dicas de sobrevivência em espanhol e na língua nativa do povo Huitoto; e o voo de helicópteros com megafones, passando mensagens da avó das crianças a dizer quem estavam ser procuradas.
Foram mobilizados 150 soldados e 200 voluntários de organizações indígenas locais, mas a vasta e densa floresta tornou tão difícil a visão de toda a gente que, contou mais tarde o exército, chegou-se a passar cerca de 20 metros ao lado de onde as crianças se encontravam protegidas.
A televisão colombiana difundiu no domingo imagens do momento em que as quatro crianças foram resgatadas.
As imagens, captadas de um telemóvel, mostram as quatro crianças visivelmente desnutridas, a mais nova nos braços de um dos homens indígenas, que cantam, fumam tabaco (uma planta sagrada entre a comunidade) e dão graças com alegria.
Um dos indígenas, Nicolas Ordoñez Gomes, contou em estúdio que a primeira coisa que uma das crianças lhe disse quando a pegou ao colo foi que tinha fome.
Uma outra, depois de receber um pouco de comida, disse que a mãe tinha morrido e pediu pão e salsichas.
As quatro crianças, com 11 meses, 4, 9 e 13 anos, estavam desaparecidas na selva amazónica colombiana desde 01 de maio, após a queda de um avião, e foram encontradas na sexta-feira pela equipa que participava nas buscas, que incluiu militares e indígenas.
Os menores viajavam com a mãe e outro acompanhante numa pequena aeronave, um Cessna 206, que desapareceu dos radares a 1 de maio, nas imediações de San José del Guaviare, no sul da Colômbia, para onde se dirigia.
A aeronave foi encontrada na vertical, com a zona frontal contra o chão, entre uma vegetação densa.
Os meios de salvamento recuperaram três corpos: o do piloto, o da mãe das crianças e o de um dirigente da comunidade indígena Huitoto.
A esperança de que as crianças pudessem ser encontradas com vida foi alimentada pela descoberta, na selva, de objetos pessoais, assim como de fruta parcialmente comida e de um biberão.
A descoberta de um abrigo improvisado, feito de paus e ramos, manteve os socorristas com esperança de que pudesse haver sobreviventes.
A selva é muito densa e perigosa nesta zona particularmente remota e as buscas são dificultadas pela presença de animais selvagens, árvores até 40 metros de altura e chuva intensa.
As crianças estarão agora a receber cuidados médicos, a nível físico e mental. Uma das principais preocupações, segundo a imprensa colombiana, será a de aferir o impacto psicológico dos traumas a que os menores foram sujeitos.
*Fonte, BBC e El Colombiano