No meu tempo não havia quem fosse com tanta frequência ao restaurante como hoje, mas em contrapartida, convidavam-se os amigos para almoçar ou jantar na nossa própria casa.
Esse convite, que era franco e não um fardo, era também bem farto, e certamente tanto, que vos vai surpreender.
Nesses saudosos anos 50, havia em cada casa quem tivesse tempo, gosto, disposição e saber, para fazer tudo, a tal “dona de casa”, que na realidade não era dona senão dum trabalho imenso, mal-agradecido, e até pouco valorizado, mas precioso e notoriamente terno; a “dona de casa” esticava o tempo para tudo, menos para si.
Nem em todas as casas havia empregada doméstica, como se calcula, e o tal convite obrigava a uma ementa pesada, pois oferecia um vasto cardápio.
Para começar uma sopa bem quentinha (havia quem a servisse no fim, se fosse na zona Norte); vinha depois o prato de peixe, servido com vinho branco, e uma salada a preceito; a seguir o prato de carne, em geral feito no forno, bem apuradinho, com as batatas da praxe, e claro, com vinho tinto. Por fim a sobremesa que podia ser de fruta ou doce.
E quando tudo parecia terminar com o cafezinho à maneira do conviva, havia, para quem ainda aguentasse, um digestivo, adocicado para as damas, e destilado para os que nada faziam senão “marfar”, como se dizia na altura.
Isto que aqui vos conto, não tem pitada de exagero, era mesmo assim, para não mencionar, antes da janta, uma ou doutra entrada para “fazer boca”, como um extra da cozinheira, coitada, que era a mesma que iria depois lavar os pratos, à mão, que máquinas não havia, e arrumar a louça; pobre dona e casa, que tão contente ficava, quando dava conta de que tudo que viera para a mesa, não deixara restos…
Amigo era amigo, sem preconceitos de etiqueta; comia-se com compostura sim, mas sem forçada cerimónia, e nem a mal se levava usar o guardanapo ao pescoço.
Como calculam, nessa altura não se falava ainda de calorias, nem o colesterol era do bom e do mau…e não havia é claro, take away ou fast food.
É preciso dizer, que isto era exactamente assim, mas uma vez por outra, não era, como bem calculam, em todos os dias do ano…
E deixo este meu pensamento:
“O comer quando é um vício, paga-se duplamente: ao merceeiro e ao médico!”