Chama-se Marina Ovsyannikova. Tem 43 anos, é jornalista e editora no canal estatal russo Channel One. O vídeo tornou-se viral. Uma jornalista do maior canal de televisão russo interrompe o noticiário com um cartaz anti-guerra nas mãos. O presidente ucraniano elogiou a coragem.
Quem visse o vídeo poderia até pensar que era uma brincadeira. Mas não era. Aconteceu mesmo. O que mostra a bravura do povo russo que mesmo sabendo poder ir preso até 15 anos, luta desta forma contra o regime de Vladimir Putin.
Quando uma colega apresentava o jornal em direto, Marina Ovsyannikova apareceu-lhe nas costas empunhando entre as mãos um cartaz a apelar ao fim da guerra e a pedir para os russos não acreditarem na propaganda que é transmitida pelo Kremlin.
O Tribunal Distrital de Ostankino iniciou uma audiência contra Marina Ovsyannikova e o seu advogado é o bielorrusso Anton Gashynski, que foi privado da licença na Bielorrusia
Marina Ovsyannikova foi multada em 30 mil rublos russos e afirma que foi interrogada durante 14 horas.
“No war” – não à guerra – era uma das frases escritas em letras garrafais no cartaz de Marina Ovsyannikova, em que estavam também pintadas as bandeiras da Ucrânia e da Rússia. “Não acreditem na propaganda”, “estão a mentir-vos”, podia ler-se ainda em russo.
Esta editora do “Canal Um” interrompeu o noticiário televisivo mais visto na Rússia com o cartaz nas mãos e aos gritos de “não à guerra!”, “parem a guerra!”.
Marina falou sobre a anexação da Crimeia.
Os russos ficaram “em silêncio em 2014, quando tudo isto estava apenas no começo. (…) Não fomos a comícios quando o Kremlin envenenou Navalny. Apenas assistimos silenciosamente a este regime desumano. Agora o mundo inteiro afastou-se de nós, e mesmo 10 gerações de nossos descendentes não serão suficientes para lavar a vergonha desta guerra fratricida”, afirmou resoluta.
Usar o termo “guerra” para descrever o conflito na Ucrânia é ilegal na Russia, de acordo com uma lei de 4 de março, que proíbe a disseminação de notícias falsas e desinformação.
Moscovo refere-se à invasão da Ucrânia como “operação especial” para “desmilitarizar” o país. Os prevaricadores incorrem numa pena de até 15 anos de prisão.
Segundo dados da União Europeia, mais de 14 mil cidadãos foram detidos “em mais de 140 cidades” russas por se oporem à guerra.
“Estou envergonhada”
Marina Ovsyannikova foi detida após o protesto. Numa mensagem de vídeo pré-gravada, a jornalista disse que o seu pai é ucraniano e a sua mãe russa, e “nunca foram inimigos”.
Envergonhada disse que como jornalista tem ajudado a “disseminar propaganda do Kremlin”.
“Agora, estou bastante envergonhada por isso. Estou envergonhada por permitir que mentiras fossem ditas no televisor, envergonhada por ter permitido que os cidadãos russos fossem ‘zombificados'”, acrescentou.
Ovsyannikova acusa o Presidente russo, Vladimir Putin, de ser o responsável pela guerra.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, classificou o incidente de “hooliganismo”.
“O Canal Um, tal como os nossos apresentadores, é um símbolo de informação de alta qualidade, atempada e objetiva”, sublinhou.
A emissora estatal anunciou que está a investigar o caso.
A partir de Kiev, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, elogiou Ovsyannikova e prestou homenagem a todos aqueles que, na Rússia, se manifestam contra a invasão russa à Ucrânia.
“Estou bastante grato aos cidadãos russos que não cessam de tentar dizer a verdade”, disse Zelensky, “e pessoalmente à mulher que entrou no estúdio do Canal Um com um cartaz contra a guerra.”
O Presidente francês, Emmanuel Macron, prometeu discutir com o homólogo russo, Vladimir Putin, proteção especial para a jornalista, “seja na embaixada ou através de asilo”.