A cidade de Lisboa nos anos 50, tinha uma interessante e animada vida própria.
Não havia Televisão e a Rádio era a rainha da comunicação falada; no que toca à escrita os livros que sobravam no stock das livrarias, vendiam-se na rua em tabuleiros a preço mais baixo, e os jornais que eram muitos, saíam de manhã e à tarde, e rapidamente se esgotavam a tal a ânsia de ler, saber e comentar as notícias do país e do mundo.
Os pregões eram uma cantilena que dava um cunho à cidade, que atraía e distraía…
A venda dos jornais era feita pela admirável figura do ardina, profissão que se perdeu quando a distribuição se começou a organizar.
O ardina era normalmente um jovem, ágil e ladino, que calcorreava as ruas, às vezes em corrida, para chegar primeiro aos locais onde se encontravam os presumíveis clientes, praças, cafés, paragens de elétrico, pontos de cavaqueira ou de visita obrigatória.
A correr saíam sempre da gráfica logo que os jornais saíam da máquina e com um pesado maço deles debaixo do braço; assim faziam a lida de todos os dias, por bem pouco certamente.
Os ardinas tinham também os seus fregueses certos para o jornal da manhã, e serviam-no duma forma original que aqui vos conto: madrugada dentro, traziam os jornais até à rua em que morassem, dobravam o periódico em laço, e do passeio os arremessavam para a sacada do andar respetivo, fosse o primeiro ou o segundo, e espantosamente, nunca falhavam, lá caía o jornal no sítio certo; quando o cliente acordava e abria a gelosia, da estava o seu jornaleco que, desfeito o laço, ficava prontinho para ser lido ao ‘matabicho’ [pequeno almoço].
Ainda hoje tiro meu chapéu ao ardina, espantosa figura humana dessa Lisboa doutras eras, o Porto também os tinha.
E aqui está o meu pensamento da semana:
Nós só damos valor aquilo que nos faz falta…
quando não o temos!