Curiosa estrada vos trago hoje, do tempo em que vivia no fabuloso continente africano. Aproveito essa
“viagem” para vos pôr a par das coisas a que, nessa altura, a condução obrigava, para garantir a ida e a volta de quem andava ao volante.
Para começar vos digo que para obter carta de condução, nos longínquos anos 50, o exame incluía código, e mecânica, mesmo que fosse para veículos ligeiros.
A prova de mecânica pode hoje parecer bizarra, mas na verdade era mito útil nessa época, conhecer o funcionamento da viatura e do motor, para poder resolver os problemas mais comuns, como substituição de câmaras de ar, desentupimento do carburador, mudança da bateria, como safar o carro se o motor parasse sobre a linha do comboio, onde estavam e como se substituíam os fusíveis vitais, por exemplo os dos faróis, e outras coisas quejandas, para as quais hoje se chama de imediato o carro de apoio, que ao tempo, como calculam, ainda não existia.
Vivia nessa altura num dos mais belos recantos da costa oriental de África e as distâncias entre povoações eram por vezes de centenas de quilómetros, e as estradas mais longas eram de macadame (pedra, gravilha e saibro), sendo alcatroadas somente as das cidades;
Não havia pelo caminho estacões de serviço, nem em tal se pensava, e a mais próxima bomba de combustível, manobrada à mão, podia estar a muitos quilómetros de distância, razão pela qual ninguém partia de viagem sem ter no porta-bagagens 20 litros de gasolina suplementar, e outros tantos de água potável, para manter sempre cheio o radiador, para além de e uma pá, ferramenta indispensável para desenterrar uma roda.
Havia por lá, à saída da capital e conduzindo e à vila mais próxima, região produtora da mais saborosa banana do mundo, um troço de estrada original, com cerca de 30 km de extensão, que consistia de duas faixas de cimento, com cerca de 1 metro de largura cada, com 80 cm de espaço de areia compactada, entre elas; os carros rodavam sobre essas faixas, uma roda em cada uma, com atenção e habilidade sim, mas até com relativa segurança e comodidade;
Mas, como podem imaginar, quando vinha um veículo em sentido contrário, era preciso sair para a margem lateral, também de areia, cruzando-se os carros cada um com uma roda numa faixa e a outra no areal da berma, até poderem voltar de novo às duas, e seguir cada qual na sua direção.
Isto parece doutro mundo, mas a verdade é que durante anos foi o pedaço mais rápido do caminho que ligava duas povoações, a 80 Km uma da outra. Não havia alternativa, mas nunca ouvi falar em desastres de monta, nas “faixas paralelas de cimento”. Acreditem ou não.
Queixem-se lá agora do preço das portagens…
E que saudades eu tenho de lá passar, e das bananas apanhadas do cacho, e comidas ali mesmo, no meio do além, com o sol caindo impiedoso, mas ao mesmo tempo poderoso e criador.
E se o tempo não volta para trás, a recordação ajuda a que se não perca a imagem.
E a propósito aqui vai o meu pensamento da semana:
“Quando a solução ou o dinheiro escasseiam…
sobra sempre a imaginação! ”