É com muito gosto que inicio uma crónica no Segue News. Proponho-me escrever sobretudo sobre temas de alimentação (daí o nome), sustentabilidade, ambiente, mas poderá ser mais abrangente, ao sabor de temas que me vão deixando, lá está, “bem ou malpassada” (passada aqui quer dizer “em nervos”). É, aliás, por estar passada há muitos dias, enquanto assisto ao desfile diário de casos e casões, envolvendo governantes ou ex-governantes (políticos!) que, alegadamente ou efetivamente embolsam, milhões de euros, dos impostos pagos pelo Zé Povinho (nós!), que a minha primeira crónica é sobre o meu pobre país.
Porque é com muita desilusão que vejo como enquanto lá, na alta roda política, uns poucos se abotoam tão bem, cá fora, na vida real, na vida dos que sobrevivem, com as escassas centenas de euros/mês – salários que a pobre economia portuguesa permite -, o Serviço Nacional de Saúde vai de mal a pior; na Escola os professores fartos de ser desvalorizados fazem piquetes de protesto dias sem fim, sem que o Governo se dê ao trabalho de falar com eles e garantir condições de trabalho a uma profissão essencial a um país que se quer moderno e evoluído. Depois, não há creches nem lares de idosos com preços acessíveis e condições condignas ao rendimento da classe média baixa a que pertence a maior parte da população. Aliás, nem casas há com rendas acessíveis…
Outro problema que me faz pensar no estado desta democracia é este novo modus operandi do Governo desde que António Costa se fez primeiro-ministro, que é, perante trabalhadores em greve, ignorá-los. As greves e protestos prolongam-se no tempo, o Governo assobia para o lado, aparentemente à espera que os trabalhadores desistam, vencidos pelo cansaço. Muitos descontentes não só desistem dos protestos como desistem do país e emigram. Quem não conhece alguém que recentemente desistiu de esperar viver bem aqui e emigrou? Este modus operandi aplicou-o o Governo aos médicos, aos enfermeiros, aos pilotos da Transtejo… E é agora aplicado de novo aos professores, que só não emigram porque a maioria já está na casa dos 50 anos e acha-se velho para dar o salto.
Se continuar a pensar vou encontrar mais exemplos que mostram como o sistema geral em Portugal não funciona, enquanto “lá”, na alta roda da política “alguns” se revezam pelos melhores poleiros do país. Nesses “poleiros” usufruem-se de salários de país rico (30 000 ou 50 000 euros/mês), e olha-se de cima para a maioria da população que tem que sobreviver com 700 euros/mês, ou menos. Assim é na TAP onde os simpáticos da administração ganham num mês o que um funcionário do catering ou dos snack bares do aeroporto ganham em quatro anos. Na TAP, que só não foi à falência porque recebeu milhares de milhões de euros dos contribuintes portugueses, que apesar de só ganharem em média 700 a 1200 euros/mês, ainda conseguem pagar salários 30 mil euros mensais (ou mais) aos administradores da companhia aérea. Um milagre!
Posso aqui partilhar o meu exemplo. Sou licenciada, pós-graduada, durante 20 anos fui jornalista do quadro de uma empresa privada e nunca cheguei a ganhar mil euros. Quando fui despedida, aos 47 anos, não só não recebi uma indemnização milionária, como não recebi indemnização, ponto. Aliás, o meu patrão despediu-me sabendo perfeitamente que podia fazê-lo sem pagar a indemnização a que a Lei alegadamente obriga.
Creio até que a justiça é a pedra de toque desta fraca democracia portuguesa porque não existe para os desgraçados que ganham 700 a 1000 euros mês. Continuemos a ver o meu caso, que estava nessa gama de salários… Como o meu ex-patrão me ficou a dever dinheiro, contratei um advogado, mas só consegui fazê-lo, porque me juntei aos outros 40 que foram despedidos comigo. Neste caso, juntos somos mais fortes porque isso permitiu baixar os custos do processo tornando-o acessível, de outro modo, sozinha, eu nunca conseguiria processar o meu patrão. Não teria dinheiro, e claro que ele sabia disso. Já despedira outras pessoas antes, também sem indemnizar e muitos, sozinhos, não avançaram por falta de meios.
Já os ricos sim. Podem pagar a advogados ao ponto de arrastarem tanto os processos que estes acabam por prescrever, de modo que o crime, a corrupção, acabam por compensar sim.
Ora, sem justiça igual para todos, com estas arbitrariedades, pode dizer-se que um Estado é democrático? No meu caso, se conseguir que seja feita justiça parte da indemnização (que cerca de 2% da que a engenheira Alexandra Reis recebeu da TAP) será para pagar os honorários do advogado.
Como voltei à universidade porque quero fazer uma mudança profissional, convivo com os jovens, de 20-21 anos. Sabem qual é o principal objetivo deles para conseguirem ser alguém na vida? Por acaso já nenhum deles fala em inscrever-se nos partidos políticos, e a maioria também não acredita que possa mudar para melhor as coisas em Portugal. O que eles querem é emigrar. E, tendo em conta que a vida é tão curta e temos mais é que ser felizes, quem é que os pode condenar?
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