O Jornal de Paleontologia de Vertebrados confirmava recentemente que o dente e ossos descobertos entre as décadas de 70 e 90 nos Alpes suíços provinham de um ictiossauro; réptil marinho que há 200 milhões de anos vagueava os seus 20 metros de corpulência pelos dois oceanos rodeando Pangeia, o super-continente daquela Era.
Fóssil esse que foi descoberto nos Alpes suíços a 3.000 metros acima do nível médio do mar.
Mercê o incessante movimento de placas tectónicas que em muitas dezenas de milhões de anos empurraram literalmente o fundo dos mares para estratas de quota mais elevada, pergunta-se: quanto do fundo dos mares não ‘andará’ pelo solo que pisamos sem que nos apercebamos?
Os Himalaias, consabido é, são consequência da progressão rumo a norte, no relativamente veloz ritmo de catorze (14) centímetros ao ano do que é hoje o subcontinente indiano depois deste se ter separado de Madagáscar.
Após embater na placa euro-asiática há 55 milhões de anos (autores há que preferem uma data rondando os 35 milhões de anos, mas aqui para o efeito, tudo bem), o subcontinente indiano fez amarrotar por subducção o pico rochoso do Evereste elevando-o no tempo para onde se situa hoje – a oito (8) quilómetros de altitude.
A notícia do ictiossauro recordou-me a visita há largos anos de um amigo, geólogo de profissão, que preferia almoçar algures fora do reboliço da cidade em local próximo da Natureza.
Assim sendo fomos a um restaurante com mesas de permeio frondoso arvoredo, sobranceiro a um casarão de traça victoriana com 48 divisões que desde 1986 faz parte do acervo histório sul-africano: a mansão de Sammy Marks.
Sammy Marks emigrara da Lituânia ainda jovem. Numa efervescente República Boer, onde a descoberta do ouro em1852 trouxe gente de praticamente todas as latitudes, arrojou-se com um familiar ao empreendimento de um pequeno negócio de fornecimentos a minas e a garimpeiros do metal aurífero.
Com o andar dos anos fez fortuna como empresário industrial e agrícola, residindo de 1888 a 1909 com a sua mulher e nove filhos na residência que hoje é museu.
Trata-se de um repositório de mobiliário e decoração do século 19 recheado de artigos de cerâmica, de fina porcelana, faqueiros de prata, quadros a óleo, biblioteca repleta de vasta colecção de livros, ampla cozinha com um fogão de dez bocas, casas-de-banho típicas da época, e tudo mais que o visitante pode apreciar durante visita guiada de para cima de uma hora.
Como geólogo o nosso amigo olhava inescapavelmente mais para o chão do que para o imponente casarão, notava eu; apontando o dedo perguntou-me: “Estás a ver por onde este solo em Ditsong já andou?”
Sinceramente, teria asseverado eu, que o dito solo não ‘andara’ por parte alguma; parecia-me muito bem ‘atarraxado’ ao chão. Até reparar nos pequenos pedaços de cascas de moluscos fossilizados, às centenas, na poeirenta passagem rumo ao restaurante.
Aquela zona a uns 20 quilómetros de Pretória terá uma quota de uns 1.400 metros acima do nível médio do mar, mas tudo indicava que em tempos idos o seu solo, tal como o nosso amigo geólogo assinalara, já ‘andara’ pelo fundo dos mares.
Para a maioria dos visitantes a imponência do Museu Sammy Marks fará com que nem note que esteja a pisar solo que serve de amostra óbvia da História da Geologia, situado em vôo de pássaro a 1.500 quilómetros da orla costeira meridional ou a 500 quilómetros da orla oriental sul-africana.