De comediante a herói do povo

Quem é Volodimir Zelensky? Como é que um comediante de televisão chega a presidente da Ucrânia? E porque razão se está a tornar um herói do próprio povo com a invasão russa?

Foi quase por acaso que, Zelensky, de 44 anos, um bem sucedido comediante de televisão, que fez capas de revistas, protagonizou vários filmes, era ator de ‘stand up’ comedy, se tornou presidente da Ucrânia.

Porém, nem tudo são rosas e quem esperava que Zelensky era um fraco, enganou-se. O povo ucraniano está a considerá-lo um exemplo, um herói.

Agora no centro das atenções, e apesar da carreira anterior se ter toda inclinado para a veia cómica, Zelensky é formado em Direito e tem estado de ferro e cal no seu posto de chefe de Estado. Já lhe foi oferecido um lar provisório fora do país, pelos americanos, o comediante, imagine-se, recusou para ficar ao lado das tropas e da população ucraniana neste difícil momento da invasão russa.

Zelensky tem feito discursos e apelos à defesa da nação, tem pedido a todos para defenderem o país, para agarrarem em armas e lutar contra o invasor. Ele tem, de facto, dado ânimo, esperança e força às suas próprias pessoas. E, ao contrário do que muitos esperavam, não fugiu de Kiev para se proteger. Pelo contrário, está vivo, está lá e a lutar mano a mano ao lado dos seus.

Este tipo de comportamento, de quem já se podia ter posto a milhas para salvar a pele, é visto pela população ucraniana com muito bons olhos. A maioria já o considera um herói, um destemido, de certa forma, alguém que está ao lado do povo a sofrer os mesmos horrores, mas mantendo-se firme.

“Não precisamos de outra Guerra Fria, ou uma guerra sangrenta, ou uma guerra híbrida. (…) Mas agora, o que está a ser decidido não é só o futuro do nosso país, mas o futuro de como a Europa quer viver”, disse num dos seus discursos já durante a invasão.

Além de tudo isso, o comediante e presidente ucraniano tem uma forte presença nas redes sociais, Twitter, Instagram e Facebook, onde revela passo a passo tudo o que se está a passar no território. E pede coragem a todos. Pede firmeza. Pede que defendam o que é deles.

Humorista de sucesso

Até o início de 2019, Zelensky era um conhecido e bem sucedido humorista na Ucrânia, com um patrimônio avaliado em cerca de um milhão e 500 mil euros.

Num dos programas de televisão mais visto no país, “Servo do Povo”, representava um presidente. Era um programa de sátira política criado e produzido por ele.

O enredo era atual: um professor de história do ensino médio, com trinta e poucos anos, insatisfeito e revoltado, que é inesperadamente eleito presidente da Ucrânia, após um vídeo contra a corrupção ter viralizado na internet.

É caso para se dizer que a realidade imitou o guião e, em 2019, sem qualquer experiência na política, Zelensky foi eleito à segunda volta com quase 75 por cento dos votos contra os 25 por cento do então o presidente e bilionário Petro Poroshenko.

Os ucranianos estavam desejosos de mudança e o estilo jovem e irreverente de Zelensky, muito crítico às velhas políticas do passado, foi o mote para a vitória.

Na verdade, Zelensky era muito vago nas propostas e no discurso anti corrupção. Como humorista fez uma campanha nas redes sociais que humilhava os candidatos tradicionais. O slogan de Zelensky era: “Se não há promessa, não há deceção”.

O seu partido político tinha o mesmo nome do programa de TV, “Servo do Povo”.

Ainda pulando à área da fantasia de um guião, a cena do programa Servo do Povo que ficou mais famosa, é aquela em que o presidente empunha duas metralhadoras Uzi e faz uma chacina no Parlamento ucraniano. Mas isto era no guião.

Volodomir Zelensky surge numa altura em que os ucranianos estavam todos contra a classe política vigente. O voto dado a Zelensky foi como de protesto. A população descontente ansiava por mudanças, a economia estava em colapso.

E foi assim que um comediante foi colocado ao leme de um dos países mais pobres da Europa, com 44 milhões de habitantes, quase três décadas após sua independência da União Soviética, em 1991.

Zelensky realizou mudanças bruscas mal começou a trabalhar e dissolveu o Parlamento para renová-lo. Prometeu dialogar com a Rússia para resolver conflitos separatistas.

O presidente ucraniano recorreu aos aliados ocidentais, como os Estados Unidos, de Joe Biden, e a França, de Emmanuel Macron, para o ajudarem a controlar o crescente conflito que resultou na invasão.

Encravado entre a pressão dos russos e a dos norte-americanos, o presidente ucraniano deixou bem claro que realizaria um governo pró-Ocidente, estreitando laços económicos com os EUA e a União Europeia.

De acordo com os críticos e analistas políticos, se por um lado Zelensky representa a renovação no país, por outro pode vir a tornar-se um fantoche de outras nações e de magnatas ucranianos, como Igor Kolomoysky – proprietário da emissora que transmitia o Servo do Povo e de outros negócios que são alvo de investigações na Ucrânia.

Casado e com dois filhos

Zelenskyy nasceu a 25 de janeiro de 1978, na cidade de Kryvyi Rih, na altura ainda União Soviética, hoje, Ucrânia. É de uma família judaica, vítima do holocausto.

O pai, Oleksandr Zelenskyy, é professor e chefe do Departamento de Cibernética e Hardware de Computadores da Universidade de Kryvyi Rih. A mãe, Rymma Zelenska, era engenheira.

Em criança, Zelenskyy morou quatro anos, em Erdenet, na Mongólia, onde o pai trabalhava.

Aos 17, iniciou carreira na área do entretenimento e juntou-se a grupos de comédia ucranianos.

Formou-se em Direito, na Universidade de Kryvyi Rih, mas nunca exerceu.

Em 1997, criou o grupo Kvartal 95, que durante muitos anos fazia tournés pela Rússia e nações pós-soviéticas. O grupo passou a produzir séries de televisão, inclusive o Servo do Povo (2015 – 2019).

Entre 2009 e 2018 protagonizou 8 filmes, em 2006, participou da versão ucraniana da “Dança das Estrelas”.

Zelenskyy é casado com Olena Kiyashko, desde 2003, com quem tem dois filhos, Oleksandra, 17, e Kyrylo de 11. É um homem que gosta de correr e exercitar o corpo no ginásio.