Vai longe o tempo das salas de fumo do Oriente, onde o sonho e o entorpecimento faziam as delícias de quem usava os longos cachimbos onde o ópio, extraído das ingénuas e belas papoilas do campo, se fumava.
Esta é uma das imagens que preservo da minha já longínqua infância, como algo que, taxativamente, nunca devia experimentar.
Vieram depois outras formas de adição, algumas permitidas, como a do cigarro, que ficava bem fumar, e se tornou moda, que o cinema não deixava de propagandear na boca dos seus mais desejados astros. Vieram depois, e em força, outras substâncias que destruíram vidas, na suposição de que as construíam, e que continuam ainda presentes e activas.
A adição, ou vício, se o quiserem, faz parte da vida humana, em maior ou menor escala, e está presente nas mais discretas, mas atractivas formas. Venho hoje falar-vos de uma, que num espaço curto de anos, se tornou a maior das adições, não apenas furiosamente desejada, como imperiosamente considerada uma absoluta necessidade. Estou a falar-vos do telefone móvel, livre de fios, o famoso Telemóvel.
Todos têm um, e para tê-lo, não olharam a custos.
Quando foi inventado, se supunha ser para facilitar a comunicação à distancia entre as pessoas, mas em breve tomou inteira posse das suas vidas, e virou necessidade premente, uma forma de total alheamento de quem está presente, com perda da faculdade de escrever desenhando as letras, por o poder fazer através dum teclado, e até de somar números manualmente, o que ele, telemóvel, também faz.
Não é preciso decorar nada, nem sequer para isso usar o cérebro, basta deixar o que se quer lembrar, na sua cómoda memória. A qualquer instante se passou a poder ser erudito, procurando tudo no motor de busca; claro que no minuto seguinte, já nada se calhar se lembrará, mas que importa isso, se ninguém o nota ou comenta.
Ao almoço ou ao jantar, pode até faltar a sobremesa, mas o telemóvel, isso é que não!
As pessoas não falam entre si, dedilham constantemente, mal saboreando o repasto, reparador mental que é também, e isso acontece até entre pais e filhos.
E como todos sabem que uma imagem vale mais do que mil palavras, sem ser preciso sequer falar, se enviam fotografias: as que se devem e as que se não devem…
Se fumar era um acto que ontem dava estilo, hoje ter telemóvel dá estatuto, dependente da marca que ele, telemóvel, tiver.
Mais grave ainda: não raro é ver agora uma criança que mal anda e fala, ter um telemóvel como brinquedo predileto.
Quanto aos adultos, estou crente que ao sair de casa, até se podem esquecer de calçar os sapatos…, mas de certeza que levam, bem agarrado a si, o seu telemóvel!
Se isto não é uma adição, venha o diabo e escolha; e não posso deixar de pensar ao que ela vai levar muito em breve; ou será apenas embirração de velho?
E aqui fica o meu pensamento sobre o assunto:
“O vício faz parte da vida; mas não pode
tomar conta dela …”