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A mãe está mesmo aqui ao lado…

Ainda não são 8h da manhã e já começam os nervos miudinhos a acompanhar as papas de aveia com fruta do pequeno-almoço.

– Não te demores que a aula começa daqui a 15 minutos! – digo eu, a tentar dar o ar cool de mãe que tem tudo sobre controle.

A cara lavada, a roupa vestida e todo um cabelo por pôr em ordem!

– Não vais aparecer assim toda descabelada!

Ligamos o PC… estava tudo a postos desde o fim de semana. Apps instaladas, passwords numa folha pendurada na secretária, links e afins…

Finalmente o PC dá sinal de que está vivo e arrancamos para a plataforma Teams onde os professores decidiram criar equipas para as várias disciplinas.

Entramos na equipa de Português, a primeira aula. Vemos as mensagens, os recados, procuramos em ficheiros, trabalhos, notas…

Oh! Bolas… isto está a demorar mais do que pensávamos. Já vamos com dois minutos de atraso!

Desce, desce, sobe, procura, faz scroll down, sai da equipa, vai para o geral, procura a sala virtual…

Mas que porra, porque é que não encontro sala nenhuma aqui??

Quatro minutos…

Fecha, abre, volta a abrir. Oh páááá!! Agora pede a password outra vez!! Onde é que está a password do Teams?

– O que é que fizeste à folha que estava aqui em cima???

Nervos miudinhos a ficarem mais fortes, a inchar, a querer mostrar todo o seu esplendor ainda antes das 8h30 da manhã!

Encontro a folha. Password: Incorreta!

A sériooooo???

Mas porquê???

– Oh mãe já vou chegar atrasada!!

– Tem calma!!! – Digo eu, no melhor tom de voz que consigo, mas a ferver por dentro! – De certeza que há mais pais que também não estão a conseguir!

Não queria acreditar que era a única a ter problemas a ligar uma aula online depois de ter passado um sábado a preparar os ícones todos…

Decididamente, há forças superiores a tentar levar-me por outro caminho. Não o caminho da força, mas o trilho negro e obscuro das incapacidades humanas que fazem da mãe um bicho mau capaz de engolir todos à pazada sem pestanejar!

Voltamos ao início: uma coisa de cada vez, e tocar nas teclas de-va-gar como quem quer deixar o computador respirar e fazer o seu percurso em segurança pelas nuvens das internets.

Conseguimos entrar na plataforma outra vez!!! Equipa de Português, a primeira aula. Clica. Entra. Vê as mensagens. Agora são mais:

“Ó professora, não estou a conseguir entrar.”, “É para ir para onde?”, “Qual é o link, professora? Isto não está a dar”

Por dois segundos respiro fundo e penso: ok, não somos as únicas a não dar com a sala!

Vou lendo as mensagens, mas nada de resposta da professora.

Nisto são 8h30. Oficialmente já temos falta! Não aguento. Nunca pensei que fosse tão complicado quando as indicações no mail pareciam tão simples.

É isso!! Mail!! Deixa ver se enviaram algum mail a explicar melhor.

Mais vale ver no meu telemóvel para não fechar as páginas aqui do PC, penso eu!

Mail, mail… atualiza… nada!!!

A vontade que tenho de mandar tudo pela janela, é impressionante. Nisto já há papéis em cima da secretária, canetas espalhadas, o meu telemóvel e uma pilha de nervos sem precedentes!!

Telemóvel! Segunda iluminação!!! Deixa ver no grupo das mães se elas sabem de alguma coisa!!

O grupo das mães, como lhe chamo, na verdade é um grupo de apoio entre encarregados de educação da turma, onde vamos expondo as nossas dúvidas sobre a vida deles!

Tipo: “Alguma mãe sabe se os TPC de HGP estão no manual ou nas fichas?”

“A minha diz que não tiveram aulas de Português e não foi ninguém substituir.”

“Quando é o teste de inglês, alguém sabe?”

Enfim… estamos todos no mesmo barco. E se estiver a afundar há sempre alguém que desenrasca uma solução!

Abro o WhatsApp: “Bom dia!! Alguém conseguiu entrar? Não se percebe onde é a aula!”

Finalmente várias respostas do outro lado. O telemóvel fazia plim, plim, plim, como uma slot machine em Red Bull!

Tudo em pânico geral! Constato que existe pelo menos uma dúzia de famílias a tentar fazer 30 por uma linha para que possam largar os miúdos na escola (mesmo que no quarto, na sala ou na cozinha!).

Trocamos pedidos SOS, mensagens curtas de apoio, dicas de resolução de problemas, tutoriais de ajuda para instalar aplicações, e todo um rol de coisas que ninguém queria estar a fazer àquela hora!

Parece que afinal a aula é no Zoom! Quê???? Andámos no pavilhão errado! Lá para fora novamente e atravessa o pátio virtual até ao bloco “Z”! Zoom: aqui estamos nós. E vai de fazer entrar à bruta o ID e a password que teimam em não colaborar. Nisto, já nem sei se vamos a tempo da primeira aula ou se é preferível avançar para Matemática e com orgulho dizer que chegamos antes da hora!

De repente:

– Olá Nuna! Vejo que já conseguiste entrar! Bom dia!

E pronto! Estamos as duas no ecrã, na aula da professora, quase 20 minutos depois!

Não tendo a desculpa que havia trânsito para justificar o atraso, vejo-me a explicar que a net caiu e as passwords “coiso” porque a plataforma afinal… isso…

Respiro fundo.

– Ficas bem? Posso ir embora? Precisas de ajuda da mãe em mais alguma coisa? (como se o facto de eu estar ali tivesse na realidade ajudado, penso eu!)

Ainda vou a tempo de lhe dar um beijo à frente de todos os que já tinham conseguido entrar e saio de fininho! Ainda pensei numa retirada à “comando” em combate, rastejando pelo chão até à porta do quarto… mas sempre acreditei que a melhor forma de ser discreta é assumi-lo com naturalidade à vista de todos. Saio orgulhosa. Missão cumprida. A miúda está na escola!

Encosto a porta, respiro fundo outra vez… preciso dum café!

Isto foi só o início, penso eu. Amanhã vai ser mais fácil. Quero acreditar. Temos de nos adaptar a estas novas rotinas, a estas formas de estar em nossa casa e ter uma turma de 20 e tal pessoas a entrar pelo quarto adentro, a ouvir a criança a falar sozinha de auscultadores postos qual operadora de call center e a demonstrar toda a sua autonomia e resiliência. Caramba, afinal foi para isto que a criei, para ultrapassar desafios, para resistir, para dar a sua opinião, para ser livre.

Já na cozinha, de café entre as mãos, olho de soslaio para o quarto dela e apercebo-me que cresceu.

Quem estava nervosa e com medo de falhar ao toque de entrada era eu.

O mundo agora é vosso! Boa viagem, miúda!

A mãe está mesmo aqui ao lado, se precisares, quando precisares, sempre…

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